sexta-feira, 23 de novembro de 2012

XXV – Ano Novo (Parte I)



Para nossa sorte, não havia muita gente na parte da praia que escolhemos, e conseguimos nos instalar com certo conforto. Ariel tentava manter uma carranca quando André a encarava, mas colocava-se a observá-lo sempre que este se distraía. Melissa e Reinaldo me lançavam olhares piedosos.
– Eu estou bem. Mesmo! – tentei ser convincente.




Regados por um saboroso pró-seco, passamos o tempo conversando e beliscando os aperitivos comprados para a ocasião, enquanto as crianças catavam conchas e construíam castelos de areia. Ainda fazia frio, mas era possível ficar sem luvas mesmo ao ar livre. A hora da virada se aproximava e comecei a achar que Nina havia desistido de ir. Talvez fosse melhor assim.




Porém, faltando alguns minutos para o início da contagem regressiva, ela apareceu, com seu sorriso iluminado.
– Desculpem... Sabem como o Trev às vezes complica as coisas... – justificou-se desconfortável.
– Pegue uma taça, Nina... Venha brindar com a gente... – chamou Mel, fingindo não notar. – O espumante está magnífico!




Sentamos à beira da água para assistir a queima de fogos. Era praticamente igual todo o ano, mas nunca deixava de emocionar. Reinaldo e Melissa beijaram-se tão apaixonadamente como nos tempos de faculdade, o relacionamento desse casal sempre foi inspirador. Esta época de comemorações e renovações sempre nos faz pensar em nossos sonhos e projetos, tudo que desejamos realizar no novo ciclo que se inicia. Além da expansão do Pôr do Sol, evidente por conta dos novos investidores, eu pretendia pedir Leandra em casamento, e, quem sabe, tentarmos um bebê. Agora esse sonho parecia tão distante.




Não muito tempo depois, Rey e Mel se despediram, Deco dormia pesadamente nos braços do pai e Ariel estava apagada em uma das namoradeiras da areia.
– Está de carro? – perguntei a Nina.
– Eu vim de táxi...
– Eu levo você...
– Não precisa, Yuri, está a poucos metros de sua casa, e o que vai fazer com a baixinha?




– Ela continuará dormindo no banco de trás. O bairro de Trevor também não é tão distante assim.
– Não há necessidade... mesmo! E depois... Você já bebeu o suficiente para ser pego no bafômetro... Eu ligo para a cooperativa e num instante mandam um carro...
– É ano novo. Não acho que terá tanta facilidade... Então peça para te apanharem no meu endereço. É mais seguro... Eu faço companhia a você.




– Você tinha razão... – Nina informou assim que desci as escadas de volta para cozinha, depois de deixar Ariel na cama. – Não há previsão, eles vão ligar de volta se e quando tiverem alguma unidade. Acho que vou ligar para o Trevor...
– Duvido que ele tenha melhores condições de dirigir do que eu.
– Mas você acabou de levar Ariel lá pra cima... e...
– O que?
– Isso não está certo, Yuri. Eu não devo ficar aqui. Léo não vai gostar de saber disso, e ela tem toda razão.




– Deixe que eu me preocupe com a Léo.
– Não é bem assim... Eu nem devia ter aceitado seu convite pra começar... Eu...
– Cheguei a pensar que não viria mesmo...
– Por que me convidou?
Não consegui responder, os motivos não me vinham. Quer dizer, eu sabia que ela merecia uma festa de ano novo melhor que a do Trevor, mas sequer cogitei que ela tivesse outro convite. E se Pedro a tivesse convidado? Ou qualquer outro amigo. Eu a encarava engasgado pela falta de palavras. Meu Deus, o que eu estava fazendo?




– Tem alguma coisa te perturbando, Yuri... O que é? Preferia que eu não tivesse vindo?
– Não! Nina! Claro que não, não é isso! Eu adorei que tenha vindo... eu só... – eu só não sabia o que dizer. Eu só sou um imbecil!
– Yuri... – ela chamou ternamente, acariciando minha mão. – Você quer me perguntar alguma coisa?
Droga!
Fiquei novamente mudo e ela me encorajou. – Pode perguntar.




Inspirei profundamente. Como se oxigênio fosse capaz de proporcionar alguma coragem.
– Você e o Pedro... Vocês... Oh, droga, eu não tenho o direito de perguntar isso!
– Eu tentei te contar, Yuri... Não se lembra? Na varanda da casa do Rey... No dia do Natal... Você não me deixou...
Eu me recordei. Não cheguei a cogitar essa hipótese na ocasião. Ou talvez subconscientemente eu o tenha feito por proteção? Eu não sabia dizer, eu não sabia mais nada, nunca me vi tão confuso.
– Você não tem que me contar nada...
– Ah eu sei que não... Mas eu quero. Se você estiver disposto a ouvir, é claro...




Evitando entrar em detalhes, Nina contou como foi seu efêmero, porém intenso relacionamento com Pedro. Não foi nada fácil de ouvir.
– Ele é um homem fascinante, com um brilho interior e uma energia inesgotável. Não é à toa, que as mulheres enlouquecem em suas mãos. Nunca conheci alguém tão sedutor em toda a minha vida. O Pedro cheira a feromônio, ele... – ela fez uma pausa. – Desculpe. Eu não estou querendo enaltecê-lo, nem dizer que fui ingênua e iludida, não. Eu sabia muito bem o que estava fazendo. E ele também.
Ela não me devia desculpas. Porque essa preocupação?




– Eu tinha certeza, e ele chegou a admitir pra mim que seu primeiro pensamento foi sim, se vingar de você. Não posso dizer que a ideia não fosse tentadora pra mim também. Pode me odiar por isso, Yuri. Não sou perfeita, mas acho que também nunca tentei fingir que era. Acontece que atração entre nós foi tão... forte, que esses sentimentos mesquinhos dissiparam naquela mesma noite, quando nos despedimos. Não, não ficamos juntos lá, ele já tinha uma penca de mulheres pra ter que dar conta, e eu estava acompanhada do Ian. Mas ele me deu seu número e eu liguei. Eu. – reforçou.
Era notório que ela tomava cuidado ao escolher as palavras. Esforçava-se ao máximo para não me ferir com aquela conversa, o que era impossível. Não por culpa dela.




– Bem, eu liguei, nos encontramos, e... Enfim... Nos encontramos outras vezes, e sempre que ele e eu tínhamos uma folga na agenda, o que não era muita coisa, mas...
– Então por que... – nossa, como era difícil formular uma frase, uma pergunta! – Porque não estão juntos? Porque não deu certo?
– Porque ele ama outra pessoa. E eu também. – seu sorriso ficou tímido e eu engoli saliva. – Ora, Yuri! Não é óbvio?
Sim, Pedro tinha deixado muito claro que a única mulher que ele desejava de verdade era Leandra, porém a intensidade dos sentimentos de Nina me surpreendeu.




Eu já havia feito julgamentos equivocados e não desejava ser ainda mais pretensioso portanto não podia nem afirmar que eu seria o homem a quem ela se referia.
– Desde Turim, eu pensei que você e o Ian...
– Eu queria gostar do Ian da mesma forma que ele gosta de mim, Yuri. Acredite... Ninguém nesse mundo merece mais o meu amor do que ele. O problema é que não é bem assim que a magia funciona. E eu sou um verdadeiro fracasso no âmbito racional. Mas as coisas mudam, não é? O mundo dá voltas... Eu não alimento as esperanças dele, mas nunca se sabe.




O telefone de Nina ressoou em seu bolso e ela se levantou para atender. Disse meia dúzia de “certo” e “obrigada”, e desligou.
– Bom, parece que dei sorte. Conseguiram um carro para me levar. – sorriu.
– Nina, eu lamento tanto...
– Não, por favor. Eu estou curtindo essa coisa platônica a minha maneira. Me sinto feliz de poder ter estado com você esses dias, e bastante aliviada por conversar sobre tudo isso. Acho que agora consigo voltar tranquila para Paris no final da semana.




Nina me deu um abraço apertado e sentido, como se fosse o último.
– Feliz ano novo, Yuri. Desejo que você seja muito, muito, muito feliz!
O nó na minha garganta se apertou, eu não queria uma despedida, não queria que ela fosse embora, mas... Eu não podia ter tudo.
– O mesmo pra você, Nina... Feliz ano novo...


♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥


Queridos,
Estou saindo para uma aventura prometida a muito tempo... Viajo próximo dia 27 (terça) para aprender a velejar em mar aberto, com previsão de volta para dia 20 do mês que vem. Previsão, por que no mar a gente depende de condições de tempo e vento. Infelizmente por outro lado, Redenção terá que sofrer outra pausa, pois não há a menor condição de eu levar meu PC a bordo, e o Leptop disponível não suporta o The Sims.
Esse tempo, estarei me comunicando por sinais de fumaça, e onde o 3G tiver alcance, por e-mail, Twitter, Facebook, G+, imessenger, SMS.
Se o mundo não acabar dia 21 de dezembro, eu prometo atualizar, na primeira sexta feira depois do Natal.
Até lá. Bjks!




sábado, 17 de novembro de 2012

XXIV – De Última Hora (Parte V)



Léo foi mais uma vez embora. Sem adeus, sem me dizer o que faria, sem prazo para volta. Eu me senti sem chão. Alguns dias se passaram, o réveillon se aproximava e ela não atendia minhas ligações. Ao mesmo tempo, eu não me sentia no direito de bater na porta de seu apartamento, tampouco ousava ligar para a casa de doutor Olívio atrás de notícias.




Não queria ser pessimista, mas era certo que Léo ainda amava Pedro, na verdade mesmo que decidisse viver comigo pra sempre, jamais deixaria de amá-lo. Acho que sempre estive preparado para perdê-la e talvez tenha sido esse o meu grande erro. Talvez Léo enxergasse isso como falta de amor, ou insensibilidade, até mesmo covardia. Ela estaria muito equivocada. Não existem dúvidas de que a preferia ao meu lado, no entanto jamais entraria numa guerra de nervos, coação, chantagem emocional.




“Preciso ficar sozinha. Estou furiosa e confusa, não é um bom momento para falar com ninguém. Viajo hoje e ainda não sei quantos dias ficarei fora. Desculpe-me.”
O SMS chegou assim na antevéspera de ano novo, enchendo-me de dúvidas e inseguranças. Eles haviam se encontrado, conversado? O que poderia ter acontecido para que ela não tivesse decido por Pedro? Ou por mim? Sozinha por quê?




– Nicole, você sabe de alguma coisa? Por favor, me dê uma dica, pela primeira vez eu me sinto cego... Não consigo compreender! – acabei apelando para para minha prima, que ainda estava aproveitando os poucos dias de férias na casa de sua mãe.
– É claro que a Léo falou comigo, Yuri! O que você tem na cabeça?! Apresentar a Nina ao Pedro na Itália, achar que tá tudo bem e esquecer de mencionar pra Léo?
– Eu não esqueci! Foi um pedido dele! Ela sabe disso! Meu Deus que drama!
– É sério que você não sabe no que deu toda essa história?
– Que história, Nick? Puta merda! Só eu estou achando tudo isso um exagero descabido?




– Nossa! Dois palavrões... Estou chocada!
– Não tem graça...
– Olha, Yuri... pelo que entendi, Nina e Pedro não se limitaram a uma “simples amizade”... Bem, isso não seria um problema, afinal os dois estavam solteiros, mas não sei exatamente de que forma a coisa foi contada pra Léo, mas foi a versão do Pedro que ela ouviu. Você sabe, ele é meu amigo, melhor amigo do Neto e eu o amo muito, mas sou ciente do quanto ele pode se descontrolar em se tratando de Leandra. O que sei é que ela está se sentindo traída. Por você e por ele.
Droga!
– Me dê o número do Pedro, Nicole. Agora!




Pedro não se opôs a me encontrar, como previ. Muito pelo contrário mostrou-se muito disposto. Deixei Ariel com Nicole e o aguardei no Horto Florestal, lugar sugerido por ele. Mesmo quando o encarei, não pude adivinhar se ele sabia do encontro inesperado que eu e Nina tivemos com Léo naqueles jardins. Meu coração batia um pouco acima do ritmo e eu quase bufava.
– Nervoso, professor? – perguntou com cinismo.




– Como pôde ser tão cretino? – fui direto ao ponto. – Como pôde se aproveitar de uma criatura boa como a Nina pra se vingar de mim?! Você... você é doente!
– Ou! Ou! Ou! Senhor Politicamente Correto, vai com calma! Não se dê tanta importância, assim, tá legal?! Eu e Nina nos envolvemos sim, mas isso não tem nada a ver com você!
– Ah, Pedro! Não se faça de santo!
– Não me faço! Mesmo! Nunca me fiz, mas nem por isso a Nina deixa de ser uma mulher extremamente atraente e absolutamente interessante. Você sabe que ela é. Ou estou enganado, e no fundo ela foi só um passatempo pra você? Afinal não foi você quem a deixou te esperando no aeroporto? Que tipo de homem faz isso com uma mulher? Posso te garantir que fui muito mais gentil que isso.




Deus, como eu desejava fazê-lo sangrar por jogar na minha cara as verdades que eu detestava relembrar! Talvez tenha sido o motivo de ele escolher um local público. Não nos matarmos.
– Se de fato a acha tão maravilhosa, porque não estão mais juntos, então?
– Ah, rapaz! Não vou te responder isso. Não é da sua conta. Mas se estiver muito curioso pode perguntar a ela... Eu achei que quisesse saber era da Léo. Foi por isso que vim.
Era óbvio que a conversa que tiveram me interessava, como era óbvio que ele faria tudo para tentar me desestruturar. Me dei conta da imensa idiotice que foi tentar algum diálogo com Pedro. Era com Nina e com Léo que eu deveria conversar.




Pedro levantou a sobrancelha e estufou o peito antes de completar. – Pensei que desejasse saber como foi a minha conversa com ela...
– Sua falsa segurança não me intimida, Pedro. Se se sentisse tão confiante, certamente não invadiria minha casa alcoolizado, falando improbidades.
– Eu tinha bebido, mas não estava bêbado. Sabia o que estava fazendo.
– É? E o que estava fazendo? Bancando o cavaleiro medieval? Pelo amor de Deus, pensei que fosse um pouco mais maduro!
– Só quero a minha mulher de volta.




– É, mas se você quiser mesmo, vai precisar agir com um pouco mais de tutano, e menos testosterona.
– Está tentando me ensinar como roubar a Leandra de você?! Surpreendente, professor!
– Léo nunca foi prisioneira em minha casa, e se você fosse menos impulsivo, ela não teria corrido para os meus braços. Você quem a entregou de presente, Pedro. Mas essa discussão não tem a menor relevância, porque para mim, é muito mais importante que ela seja feliz, independente de com quem ela deseja ficar.




Ariel pediu para dormir na casa de tia Débora com Nicole e eu não me opus. Tentei atender a vontade de Léo, não telefonando, nem tentando arrancar informações de minha prima sobre seu paradeiro, e isso não era tarefa fácil. Ainda por cima, minha imaginação criava cenas eróticas e nada agradáveis de Pedro e Nina, fazendo questão de projetá-las no meu cérebro como slides. O que estava acontecendo comigo? Porque isso me incomodava?




O telefone tocou me tirando do devaneio.
– Graças a Deus! – exclamei antes de me levantar para atender.
– Fala, veado! É o Trev! – a apresentação era dispensável, claro. – Olha só, vai rolar a tradicional festinha de ano novo aqui em casa, com muita bebida e mulheres gostosas à vontade! Se você estiver desacompanhado ainda...
– Obrigada, Trev! Mas não... Ainda estarei com Ariel, e não acredito que seja ambiente para ela.
– Porra, cara! Seu pai ou sua tia não podem ficar com ela? Orgia pura! Vai te fazer bem!




Eu suspirei, na dúvida entre dar uma resposta educada, xingá-lo, ou simplesmente desligar o telefone, mas Nina tomou-lhe o telefone das mãos.
– Ei, Yuri... É exagero dele, você sabe como Trev adora “causar”... De qualquer jeito acho que Ariel não vai mesmo achar esta festa interessante...
– É, eu sei, vou manter a programação de sempre... Quando estou com ela costumamos assistir aos fogos na praia, já que é perto. Normalmente combinamos de encontrar o Rey, a Mel e o Deco... Aliás, obrigado pela conversa que teve com ela, apesar de ela não ter tocado no assunto, parece que está bem tranquila...




– Não foi nada de mais, não precisa agradecer... Ela é muito inteligente e madura. Vai saber lidar com isso...
– Vai? Eu só espero que ela saiba que pode contar comigo, se quiser conversar...
– Ela sabe, Yuri. Fique tranquilo. Mas nem sempre vai falar sobre tudo com você... Por mais incrível que você seja, é homem... e o pai dela... No entanto ela deixou bem claro que também tem a mesma abertura com a Sônia... Vocês estão de parabéns na criação dessa menina, pelo que pude notar. Bom, mas... quem sou eu pra avaliar, não é? Nunca fui casada, nem nunca fui mãe e sequer me saí bem nos meus últimos relacionamentos...




– Ah, Nina... Eu...
– Não estou me lamentando, Yuri. Tudo bem. Apenas me justificando.
– Se não estiver pretendendo ficar bêbada nem pegar mulheres gostosas na festa do seu primo, gostaria de passar o ano novo com a gente? A comida não é das melhores, mas prometemos um belo visual e roupas cheias de areia...
Ouvi sua deliciosa risada do outro lado da linha, confortando meu coração.
– Eu vou adorar, Yuri. Obrigada pelo convite...



sexta-feira, 9 de novembro de 2012

XXIV – De Última Hora (Parte IV)



– Eu... queria te contar que vinha para Belladonna, mas fiquei na dúvida se deveria.
– Bem, o Pedro acabou decidindo por você! Da pior maneira.
– Oh! Sinto muito...
– Não sinta. – respondi mal humorado.
– Sabe, aquele dia na boate em Turim, depois que você foi embora, acabei encontrando o Pedro de novo...




– Isso não é da minha conta. – eu a cortei, e ela se sobressaltou com minha grosseria. – Me desculpe. Tive uma péssima manhã, e minha tarde já não começou muito bem.
– Quer que eu vá embora?
– Não é você, Nina. Perdão. – suspirei. – Então você e Pedro ficaram amigos? – perguntei tentando me mostrar interessado.




– Pode se chamar assim... Olha, Yuri, eu te gosto muito e confesso que no fundo fiquei feliz de te ver. Temia muito só conseguir te encontrar na companhia dela e não poder me aproximar... Desculpa.
Olhei para ela e seus olhos estavam embotados. Droga! Como eu sou desprezível.
– Eu percebi que não está com nenhum humor, então... vou deixar você... em paz...
– Ah, Nina!




Eu a puxei num abraço apertado e senti suas lágrimas molharem meu moletom.
– Eu estava com tanta saudade, eu... desculpa. – pediu em soluços.
– Por favor, pare de se desculpar...
Nina permaneceu com a cabeça em meu colo e eu a afaguei até ela se recompor.
– Gostei do seu corte de cabelo... – elogiei. – ficou bonito.




– Ah... Obrigada... – sorriu quando levantou o rosto e me encarou novamente, fazendo-me lembrar o quão linda ela é.
Continuou me encarando enquanto o sorriso se desmanchava e o silêncio começava a sufocar. Aproximou-se a ponto de seus lábios quase tocarem os meus, e creio que me beijaria se não fôssemos interrompidos pelos gritos enfurecidos de Ariel.
– Papaaaaaaaaaaaaaaaaaaai! O Deco me beijou!




– O quê? – pensei alto, tentando entender o que se passava e Nina se afastou como se acordasse de um transe.
– É isso mesmo que você ouviu! Esse... esse... esse descarado, me deu um beijo! Na boca, pai!
Eu estava atordoado. Não só pela narrativa da história, mas pela cena que eu mesmo protagonizava segundos atrás.
André vinha atrás dela na varanda, com a culpa estampada em seu olhar.
– Eu... eu... Desculpa! É que... Tio Yuri, eu posso namorar a sua filha? Eu gosto tanto dela, tanto...




O que fazer nessa situação? Ariel parecia realmente aborrecida, mas conhecendo-a como a conheço, creio que mais por ter sido pega de surpresa, do que por causa do beijo em si.
– Ei, Ariel! Venha comigo... – chamou Nina, piscando para mim. – Vamos conversar enquanto seu pai esclarece algumas coisas com o Deco?
André se aproximou cabisbaixo e envergonhado.




As duas entraram para a sala e eu me dirigi a André. – Duro, não?
– É, estou angustiado e você não me respondeu...
– Olha, Deco... Eu admiro a sua consideração em me pedir, mas eu não posso aceitar pela Ariel. Se você me perguntar se eu gosto de você como namorado dela, eu tenho como responder: sim, você é um garoto incrível e não poderia desejar melhor sorte, mas... quem tem que decidir é ela, concorda?
Ele assentiu com um meneio.
– De qualquer forma eu vou te dar um conselho. Faça um esforço e tente não agir por impulso e não force uma situação. Seja honesto, seja franco, mas não tente roubar nada de nenhuma garota sem autorização. Nem mesmo um beijo inocente. Elas podem entender tudo errado!




– Foi mal, tio...
– Não peça desculpa pra mim. Peça para a baixinha, é ela quem está chateada...
– Ariel não vai nem querer me ver, que dirá me escutar...
– Nina está conversando com ela e tenho certeza que tudo vai ficar bem entre vocês mas... não acham que estão muito novos para namoro não?
– Eu não sei se sou novo. Eu só sei o que sinto. E eu gosto da Ariel, tio. Muito mais do que gosto de qualquer amiga da escola, ou do curso de inglês, ou da vizinhança, ou de qualquer menina que já vi na TV. Gosto tanto que meu estômago dói só em pensar que pode não querer mais ser minha amiga.




Eu e Nina não tivemos mais nenhuma oportunidade a sós. Na verdade era notório que ambos evitamos tal coisa com afinco. Ariel recusava-se a falar comigo, ainda estava mal humorada quando chegamos em casa e subiu direto para seu quarto. Eu me peguei perturbado por tudo que havia acontecido nas últimas horas. Sentia-me confuso e aflito. Apanhei o telefone e disquei para a Léo, primeiro para o celular e então para sua casa. Ela não atendeu, e eu não insisti. Se Leandra precisava de tempo e espaço, eu tentaria dar.




No entanto, no dia seguinte pela manhã, ela retornou minhas ligações.
– Olá... – atendi. – Bom dia...
– Oi... – ela respondeu com simpatia. – Tudo bem?
– Tudo. Estou com saudades.
– Eu também... O que... o que vocês fizeram ontem? – perguntou. Embora se esforçasse, sua voz não estava natural.
– Passamos a tarde na casa do Rey...




– Ah legal... Eu almocei com o Tatá e Jean Pierre, Gegê e Zeca... Eles vão se casar... ano que vem.
– Léo, escuta...
– Eu posso dar um pulo até aí? – ela não me deixou continuar.
Desde quando precisava de minha autorização para vir?
– É claro... Está tudo bem?
– Sim, eu... só queria falar com você...
Desliguei o telefone com péssimos pressentimentos.




– Ele me ligou. – foram suas primeiras palavras ao entrar. Saíram quase cuspidas. – O Pedro... me ligou ontem à noite. Sóbrio, quero dizer...
– É? E vocês conversaram? – tentei controlar minha respiração ao perguntar. Em vão.
– Não... Mas ele quer... Queria ir lá em casa, mas eu não deixei que fosse. Não antes de falar com você.




– Por quê?
– Como assim? Eu queria te consultar! Se você não quiser eu não vou encontrá-lo. Não sozinha.
– Jamais interferiria desta forma entre vocês, mesmo que ele não fosse seu irmão. E se alguma coisa mudar em você depois disso, eu vou entender e aceitar.
– Como você pode ser tão... frio?!




– Eu não sou frio, Léo! Não sou e você sabe! O que quer que eu te diga? Que vou sofrer miseravelmente? Que não sei se um dia vou ter esperança de vislumbrar um pouco da felicidade que tive ao seu lado? Que não vejo sentido em nada a minha volta quando você não está comigo? É isso? Você jura que vai se sentir melhor se ouvir isso de mim?
Ela baixou a cabeça, sem argumentos.
– Você não quer tomar a decisão e quer que eu faça por você, mas eu não posso. Não tenho o direito de fazer isso, embora tenha muita vontade. Lamento Léo, não posso mesmo. Você é a única pessoa que pode resolver isso.



sexta-feira, 2 de novembro de 2012

XXIV – De Última Hora (Parte III)



– Eu não vou falar com você agora, nesse estado. Vá dormir! – ordenou Léo. – Você está fedendo a álcool e perfume barato.
– Eu bebi, mas não estou bêbado, já disse, e não tenho culpa se nenhuma mulher cheira bem como você.
– Você não tem o direito de fazer isso! Invadir a casa dos outros dessa maneira. Tem uma criança dormindo lá em cima, sabia?
– Me desculpe, pensei que estivesse com a mãe, pois ontem estava com o pai, e... ah! Esquece! Desculpe! Vem, vamos pra casa.
– Eu estou em casa, Pedro. Vá embora.




A frase lhe causou um baque, e ele assentiu, saindo cabisbaixo. Léo não olhou para mim, nem nada falou. Deu-me as costas e subiu as escadas de volta para o quarto. Praguejei internamente. Como eu podia ser tão estúpido? Não que eu achasse que Pedro fez de propósito, mas estava na cara que era o tipo de coisa que não daria para esconder. Esperei alguns minutos ainda, respirei fundo e subi atrás dela.




Léo já estava vestida, e jogava roupas e objetos pessoais numa bolsa em cima da cama.
– O que está fazendo?
– Vou voltar pro meu apartamento, Yuri.
– Ah não, Léo... Pra quê isso? Fale comigo.




Ela abandonou a tarefa e se virou.
– Sobre o que quer conversar? Sobre honestidade? Você me diz que não gostaria que eu escondesse nada, e omite que esteve com o Pedro em Turim? Na companhia da Nina! – sua voz deu um salto em decibel ao pronunciar o nome.
– Eu sei que agi errado, mas ele me pediu! Parecia tão fragilizado! O que você queria que eu fizesse?
– Que me contasse! Era o mínimo!
– Eu contei o que nos dizia respeito. Pensei que Pedro não entrasse nesse mérito.




Léo suspirou e voltou ao que fazia antes. – Sem drama, Yuri. Eu não moro mesmo aqui, afinal.
– Entendi que havia dito justamente o contrário ainda há pouco lá embaixo.
– Eu tinha que fazer ele ir embora. Ia acabar acordando a Ariel.
– Não vá, Léo.
– Eu preciso.
– Esta casa só não é sua porque você não quer.




Terminou de arrumar suas coisas e caminhou para porta.
– O que foi que o Pedro disse pra você? – inquiri, forçando-a parar.
– Que pergunta é essa? Você estava lá embai...
– Não agora, ontem! – eu a interrompi. – Na casa do seu pai, assim que nós entramos e ele nos cumprimentou. Ele te sussurrou alguma coisa...
– Para com isso, Yuri, não tem importância.




– É claro que tem importância, Léo! – exclamei exaltado. Estávamos nitidamente tendo uma discussão. De onde vinha esse ciúme que nunca senti? Eu já não me reconhecia mais. – Ele fala no seu ouvido, você mal troca qualquer palavra comigo a noite inteira, e pela manhã ele invade a casa com a certeza de que nós não tínhamos transado!
Léo ficou chocada. – Ele estava bêbado!
– Ele disse que não estava e não me pareceu tão dopado assim.




– Não me diga que você não sentiu o cheiro do álcool, Yuri! – rebateu.
– Não estava mais forte do que o de perfume feminino.
Os olhos dela brilharam de raiva, e eu esperei por um tapa, achando-me até merecedor. No entanto ela sugou o ar para se acalmar ao me responder. – Tivemos uma noite horrível, tensa. Chegamos em casa exaustos e desanimados. Nem me passou pela cabeça que você tivesse com algum tesão pra transar, Yuri!
– Eu não estou questionando o MEU tesão, Léo. – frisei.




– Você está encucado à toa...
– Então qual é o problema de me contar o que ele disse?
Leandra fez uma pausa longa, e eu sabia que travava uma guerra interior. – Ele disse que voltou pra me buscar. – soltou finalmente, e meu coração soluçou. Por alguns segundos não consegui respirar.
– E você vai? Vai embora com ele pra Itália?
Ela ajeitou a bolsa em seu braço. – Nesse momento eu só quero ir pra minha casa.




Voltei para a cama remoendo minhas reações até Ariel acordar e invadir meu quarto, percebendo meu humor e a ausência de Leandra.
– O que está acontecendo?
– Nada, baixinha... Eu só... estou com um pouco de preguiça.
– Preguiça? E cadê a Léo?
– A Léo... tinha outros compromissos hoje, e deixou um beijo pra você.




Não acreditava que Ariel tivesse engolido aquela desculpa, mas ela nada acrescentou. Eu desviei o assunto.
– E quanto a nós? Vamos ao tradicional enterro dos ossos da Mel?
– Ah, não, papai! Todo Natal?! – exclamou entortando a boca e franzindo a sobrancelha.
– Você costumava adorar... Fazia tanta questão de ir, que sua mãe brigava comigo porque não conseguia nunca almoçar com você no Natal.
– Eu gostava! Até o Deco virar um exibido!




– Ele não é um exibido, Ariel. E toca piano muito bem pra idade dele... Aposto que se existisse uma atividade que você abraçasse em sua vida, como ele abraçou a música, você também sentiria prazer em compartilhar com quem ama...
– Você tem razão... Gosto de compartilhar fotos do Justin no fórum de Beliebers... Eu ri. Sabia estava fazendo piada do meu comentário.
– Tá aí! Vou levar meu álbum pra mostrar pra todo mundo. Tenho certeza que vão apoiar. É o que mais amo na vida!
– Depois de mim, você quer dizer! – lembrei-a antes de ela sair.




Embora relutante, Ariel acabou aceitando o programa, e chegamos na casa de Reinaldo ao fim da manhã. André nos recebeu empolgado, contado sobre seus presentes.
– Ganhei um PC novinho e agora vou poder doar meu antigo para as crianças do Pôr do Sol! – concluiu. – Vem ver Ariel! Papai já montou hoje de manhã pra mim, quero te mostrar! É muito maneiro e ele já instalou The Sims 3 Sobrenatural!
Distraído naquela conversa, não reparei nas demais presenças. Trevor se aproximou para nos cumprimentar, e atrás dele, encolhida em constrangimento, estava sua prima.




– Nina! Uau! Quanto tempo! – Ariel pulou em seu pescoço assim que a viu. Ela retribuiu o gesto carinhosamente e lhe disse algo que não pude ouvir, pois Trevor me abraçava com forte animação.
– E aí, manezão! Eu podia jurar que não ia te ver hoje! Aliás, há muito que não te vejo, seu ingrato! Cadê a patroa?
– Léo tinha outros compromissos...
– Espero que não com o irmão dela, né? – provocou.




Respirei fundo. Reinaldo me puxou para um canto e disse baixo em meu ouvido. – Mandei um sms para avisar que Nina estava aqui, claro que Trevor não nos comunicou que ela vinha!
– Está tudo bem, Rey... – eu não havia checado meu celular. Gafe detectada um pouco tardiamente.




Deco puxou Ariel pelo braço e os dois desapareceram pelo corredor. Assim que tive uma oportunidade me refugiei na varanda. Trevor consegue ser muito inconveniente quando está disposto, e eu já não havia tido a melhor das manhãs. Mesmo sem virar meu rosto percebi Nina em meu encalço.
– Me desculpa, Yuri. – pediu, se aproximando. – Trev me jurou que vocês não estariam aqui. Eu jamais viria se soubesse.




– Trevor adora causar constrangimentos, eu já estou acostumado. Irrita-me apenas que ele faça essas coisas com você e com a Léo.
– Eu... posso te perguntar onde ela está? A Léo...
– Pra ser sincero, eu não sei ao certo...
– Lamento muito, Yuri. De verdade.
– É... Eu também...